Sobre a Revista
A Revista Textos e Debates aceita trabalhos acadêmicos, em fluxo contínuo, de pesquisas inéditas e originais, não divulgadas em outras revistas científicas ou livros e relacionadas às Ciências Humanas, em especial, nas áreas: Antropologia, Ciência Política, História, Relações Internacionais e Sociologia.
A proposta da revista é colaborar na divulgação científica para a inovação teórica, metodológica e/ou empírica destas áreas. São aceitos Artigos, Comunicações e Resenhas nos idiomas: português, espanhol e inglês. Os trabalhos devem ser enviados em sua forma final, apresentando consistência teórica, coerência quanto às fundamentações e alguma originalidade.
A Revista Textos e Debates está indexada em diversas bases acadêmicas como Google Acadêmico, Portal de Periódicos da CAPES , Latindex etc.
Edição Atual
Apresentação do dossiê "Entre o Estado e a Sociedade Civil- participação, negociação e reivindicação no Brasil contemporâneo".
Imagem: Joseca Yanomami, Untitled, 2011
No Brasil, as últimas duas décadas foram marcadas por intensas transformações em torno da relação entre Estado e Sociedade Civil. As mudanças no perfil das elites políticas, a diversificação e a ressignificação das formas de participação, a emergência de movimentos sociais com agendas liberais e conservadoras, o debate público em torno da crise democrática brasileira e de suas instituições, tudo isso desenhou um cenário de grande complexidade. Soma-se a isso o impacto das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NTICs) sobre as diversas formas de ação política bem como as mobilizações que reivindicam direitos e reparação de danos causados pela crise climática, pela pandemia de Covid-19 e pelo aumento das desigualdades sociais resultantes das políticas de austeridade fiscal. Esses processos não apenas reconfiguraram a interação entre Estado e Sociedade Civil, mas também impulsionaram novas agendas de pesquisa
O resultado foi um conjunto de “viradas” que envolvem desde a construção e incorporação de novos aportes teórico-metodológicos até a emergência de novos objetos de pesquisa. Podemos destacar, no plano teórico, conceitos como “repertório de interação”, “desdemocratização” e “contramovimentos sociais”. Juntas, essas noções buscam dar conta dessas novas dinâmicas na relação entre o Estado e a Sociedade Civil que emergiram nos últimos vinte anos. A primeira evidencia, para além do conflito e da representação política, as múltiplas formas de articulação entre Estado e Sociedade. A segunda, ao evidenciar processos de reversão democrática, desafia o teleologismo das teorias que, a partir dos anos 1990, advogaram o progresso irrevogável da democracia, sobretudo ao atrelá-la à expansão do mercado global. A última chama a atenção para a necessidade de abordar relacionalmente os movimentos sociais. Assim, ao mesmo tempo em que ele põe em foco as disputas entre movimentos sociais concorrentes, também nos desperta para a necessidade de estudar os movimentos conservadores e/ou liberais, segmentos até pouco tempo negligenciados pelos pesquisadores dessa área.
Em termos metodológicos, a comunidade acadêmica interessada no tema da participação e do conflito político precisou elaborar um conjunto de estratégias de pesquisas capazes de analisar grupos e organizações à direita, como também criar formas de objetivar a relação entre as dinâmicas online e offline da ação política. No plano da empiria, outros objetos de pesquisa vieram à tona nesse cenário. Para além das organizações da sociedade civil emergentes na redemocratização dos anos 1980, novos atores entraram em cena: coletivos autonomistas, grupos de renovação política, ativistas digitais e institucionais, movimentos conservadores, associações religiosas, dentre outros.
Tendo em vista contribuir para a compreensão desse cenário, o dossiê reúne pesquisas que analisam processos que interligam o Estado e a Sociedade Civil, considerando suas especificidades e interdependências no contexto contemporâneo. Os artigos que compõem este número abordam quatro fenômenos caros a esta agenda de pesquisa: a relação entre participação social e o Estado, o ativismo institucional, os diferentes constrangimentos do Estado à participação nos últimos anos e as dinâmicas entre partidos políticos e mídias sociais.
Os três primeiros trabalhos mostram como federações, conselhos e reuniões multilaterais se configuram em arenas onde os movimentos sociais buscam influenciar a formulação de políticas públicas e as concepções políticas que as estruturam.
Em Sindicalismo da Agricultura Familiar e Estado: a atuação da Fetraf-Sul frente aos governos liderados pelo PT (2003-2016), Mateus Lazzaretti, a partir de entrevistas semi-estruturadas com ex-dirigentes da Fetraf-Sul, analisa três importantes formas de interação entre o Estado e a Sociedade Civil: a participação, a negociação e a mediação de políticas públicas.
Já Mayara Mélo e Valdênio Freitas abordam essa relação a partir dos conselhos de políticas públicas. Em Conselhos de alimentação escolar: uma revisão da literatura, os autores examinam o tema a partir de uma síntese dos estudos brasileiros sobre os CAEs. Assim, fornecem um inventário dos obstáculos, das táticas de ação e dos papeis assumidos por esses conselhos na atuação junto ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). O trabalho aponta, sobretudo, a importância dos CAEs na implementação e controle social dessa relevante política pública.
Como os discursos do G20 convocam a sociedade civil para a participação? Esta é a questão central no terceiro artigo. Em Desenvolvimento, contestação e participação social na presidência brasileira do G20: uma introdução, Raquel Conceição Santos e Isabel Rocha de Siqueira investigam como os conceitos e modelos de “desenvolvimento”, “contestação” e “participação” são mobilizados na Cúpula dos Povos e no “G20 Social”. O artigo traz ideias instigantes para se pensar a participação social em uma perspectiva transnacional.
Saindo da esfera dos movimentos sociais, o texto seguinte reflete sobre o ativismo institucional a partir do caso do judiciário brasileiro. Em Ativismo judicial e a luta contra a corrupção no Brasil, Fernanda Rios Petrarca analisa o fenômeno do ativismo institucional a partir da análise dos condicionantes sócio-histórico de emergência do ativismo judicial. A autora evidencia as estratégias de ação dos agentes jurídicos cujo objetivo é, a partir do Estado, impactar as políticas de combate à corrupção no Brasil. Para tanto, ela destaca dois fatores que, combinados, foram fundamentais para a consolidação do ativismo judicial: a expansão institucional do Judiciário no pós redemocratização e a fragmentação política que marca o Estado brasileiro.
Os últimos anos foram marcados por um conjunto de experiências de “desdemocratização”. Diversos estudos têm mostrado como o Estado brasileiro, especialmente nos dois governos anteriores, atuaram no sentido de constranger, desmobilizar ou desmontar mecanismos de participação e controle social consolidados durante a redemocratização. Os dois artigos a seguir interpelam faces do bloqueio à participação no Brasil contemporâneo.
Em A extinção da SECADI como política de desterritorialização de povos indígenas pelo Estado brasileiro (2016-2022), Josué Felipe Maia examina as políticas que ameaçam os territórios indígenas. Para isso, analisa o processo de extinção da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) durante os governos de Michel Temer (2016-2018) e Jair Bolsonaro (2019-2022).
O artigo de Andrey Augusto Ribeiro se situa em uma agenda de pesquisa que se desenvolveu no Brasil recentemente. Seu foco é a repressão, criminalização ou policiamentos dos movimentos sociais e suas ações, especialmente aquelas de caráter mais disruptivo. Lei Antiterrorismo: ameaça constante aos movimentos sociais no Brasil nos apresenta os conflitos em torno da lei antiterrorismo, cujo arcabouço jurídico foi estabelecido em 2016. Assim, a partir de uma pesquisa documental, o texto se dedica à análise dos condicionantes sociopolíticos que não apenas colocaram a lei antiterrorismo no debate público brasileiro, como também possibilitaram que ela tomasse a forma de projetos de lei.
Encerra o dossiê o artigo Plataformização, partidos políticos e usos das mídias digitais, de Wilson Oliveira e Bárbara Vitória Oliveira Castro. O trabalho reflete sobre os impactos das mídias sociais na organização e funcionamento dos partidos políticos. Com base na análise das dinâmicas partidárias nas eleições de 2022 em Sergipe, os autores destacam os usos das mídias em torno da construção de candidaturas e lideranças através de redes sociais como o Instagram, o Twitter e o Facebook.
Eis, em largas pinceladas, o dossiê Entre o Estado e a Sociedade Civil: participação, negociação e reivindicação no Brasil contemporâneo. Nossa modesta apresentação, todavia, não traz senão uma “pitada” das pesquisas aqui reunidas. Convidamos, agora, leitoras e leitores a participar desse instigante e necessário debate. Antes, cumpre agradecer. Afinal, o trabalho de organizar um dossiê é necessariamente um esforço coletivo. Gostaríamos de agradecer a disponibilidade e generosidade das e dos pareceristas, autoras, autores, editora e assistentes editoriais que dedicaram seu tempo e trabalho a este dossiê. Às leitoras e leitores, além de uma boa leitura, desejámos que os trabalhos aqui reunidos lhes sejam úteis e inspiradores!
Organizadores: Saulo Vinícius Souza Barbosa (PPGS/LEPP-UFS) e Jonatha Vasconcelos Santos (PPGS/LEPP-UFS e INCT-Participa)
Artigos e Comunicações
A revista Textos e Debates é um veículo de publicação do Centro de Ciências Humanas da UFRR. Publicada desde 1995, tem por objetivo colaborar com a difusão de trabalhos originais na área de Ciências Humanas, na forma de Artigos, Comunicações e Resenhas.
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